Venho me assustando com declarações de espíritas do meu convívio, dando graves sinais de regressão quanto aos ensinamentos doutrinários sobre a pena de morte. Leio e ouço coisas que não condizem nem um pouco com seguidores de uma doutrina racional e voltada para a regeneração do ser humano. Conhecedores da reencarnação e da lei de causa e efeito, jamais poderíamos ser cúmplices de pensamentos tão bárbaros. Seguidores de uma doutrina que tem na referência do Cristo que jamais proferiu algo favorável a esta violência, aliás, ao contrário, mostrou como no caso do apedrejamento de Madalena, que não temos nenhuma autoridade moral para tal. Cheguei a ouvir que com acontecimentos tão violentos visto nos noticiários, fica difícil não desejar a pena de morte para certos casos.
Que pena, verifique se em vez de justiça, o que você quer não é vingança!!
O sentimento de revolta em decorrência da taxa crescente da criminalidade, a impunidade e a sensação de vulnerabilidade alimentam o desejo de vingança. Cansados de esperar uma resposta do Estado, a população, erroneamente, tem procurado fazer justiça com as próprias mãos. Observamos nos últimos meses cenas desoladoras de linchamento. Parece que retrocedemos à época da lei de talião, deixando transparecer a animalidade da natureza humana.
Provavelmente, uma parcela significativa da população já cogitou a ideia de instalação da pena capital no Brasil. Sempre que os noticiários divulgam aqueles crimes hediondos que chocam a opinião pública, com um requinte de sensacionalismo, o assunto "pena de morte" é relembrado. A opinião se agrava quando deixamos o posto de espectador e assumimos o papel de vítima.
Alguns dados
Atualmente, cerca de 90 países adotam a pena extrema, o que não significa que a aplicam na prática. Há uma tendência de erradicação da pena capital no mundo todo. Algumas nações estão revendo suas legislações, enquanto outras já aboliram a pena de morte de seu sistema judiciário. Por outro lado, o número de execuções tem crescido entre as que insistem em mantê-la.
Um dos países que ainda investem na pena capital são os Estados Unidos. A condenação máxima é utilizada em 32 dos 50 estados que constituem essa nação. Os americanos favoráveis à pena de morte ainda são a maioria, mas o índice de aprovação caiu nos últimos 20 anos. De acordo com o instituto Gallup, no ano de 1994, 80% dos cidadãos norte-americanos se declaravam a favor da pena de morte em casos de homicídio e apenas 16% se opunham à sua aplicação. No ano passado, os percentuais eram de 60% e 35%, respectivamente.
No Brasil ocorre o contrário: uma pesquisa encomendada pela Confederação Nacional das Indústrias em 2011 demonstrou que 31% dos brasileiros defendem integralmente a pena de morte e outros 15% em apenas alguns casos. Entretanto, 51% dos brasileiros são favoráveis à prisão perpétua.
Em 2013 foram executadas 778 pessoas em 22 nações. Ainda no mesmo ano, foram estabelecidas, ao menos, 1.925 novas sentenças de morte em 57 países e cerca de 23.392 pessoas encontravam-se no corredor da morte.
A maioria das execuções ocorreu na China, Irã, Iraque, Arábia Saudita, EUA e Somália, nessa ordem. Estima-se que o número pode ser bem maior, pois os países que vivem sob o regime ditatorial não costumam divulgar seus dados. (1)
A pena de morte reduz a criminalidade?
Alguns estudos apontam que a pena de morte é ineficaz no combate à criminalidade.
O índice de crimes nos estados americanos que adotam a pena de morte é 1% maior, se comparado com os estados abolicionistas. No Canadá ela deixou de existir em 1975 e de lá pra cá os delitos decaíram 44%. Os criminosos não deixam de cometer o dolo pensando na possível pena que lhe poderá ser infringida.
Outro importante aspecto a analisar é a possibilidade do erro de sentença. Nenhuma nação que adota a pena de morte está isenta de cometer uma injustiça. Existem vários casos de comprovação de inocência do condenado após a sua execução.
Uma pesquisa divulgada em abril de 2014 demonstra que 4% dos condenados à morte nos Estados Unidos eram pessoas inocentes. Esse estudo avaliou os casos de réus que estavam no corredor da morte entre os anos de 1973 e 2004 e conseguiram provar a inocência antes da execução. A mesma pesquisa constatou que uma em cada 25 sentenças de morte estava errada, ou seja, o acusado não tinha culpa.
É importante lembrar que a pena de morte é uma sentença definitiva. Não há como o Estado devolver a vida do executado quando se comprova a inocência após a aplicação do castigo. Se essas injustiças acontecem em países desenvolvidos, o que pensar do Brasil?
Alguns defendem que a pena de morte é cruel e desumana. Recentemente, também nos Estados Unidos, um sentenciado agonizou por cerca de 30 minutos até morrer, depois de receber uma injeção letal malsucedida. Outro caso conhecido foi a execução desastrada de um prisioneiro na cadeira elétrica. O réu suspirou várias vezes com a cabeça em chamas antes de receber a descarga fatal.
Além de tudo, os mecanismos de execução são onerosos para o Estado. Na Califórnia, as execuções anuais não saem por menos de US$ 137 milhões. Estima-se que a substituição da pena capital pela prisão perpétua custaria aos cofres públicos apenas US$ 11,5 milhões, uma economia de 70%.
Pena de morte no Brasil
O que pouca gente sabe é que no Brasil existe a pena de morte instaurada e assegurada pela Constituição Federal vigente. É o que diz o art. 5º, inciso XLVII: Não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84 [...]
Sim, a pena de morte existe no Brasil, em tempos de guerra. Além da Constituição Federal, ela é regulamentada pelo Código Militar Penal, que pune seus combatentes em casos de traição, genocídio e deserção durante a guerra. Vale ressaltar que a pena capital somente será aplicada em casos extremos. A execução acontece por fuzilamento.
A pena de morte aplicada à sociedade civil deixou de existir oficialmente em nosso país desde a Proclamação da República em 1889, todavia a última execução aconteceu alguns anos antes, em 1876, e foi aplicada a um escravo de nome Francisco, no estado de Alagoas.
Atualmente o Brasil é membro do Protocolo da Convenção Americana de Direitos Humanos para a Abolição da Pena de Morte. Segundo as leis internacionais, a aplicação da pena capital em casos de guerra é aceitável, como acontece no Brasil.
Controvérsias
Há quem defenda com entusiasmo a extensão da pena de morte à sociedade civil brasileira, contudo é necessário observar que, do ponto de vista jurídico, ela é inaplicável.
A Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 5º prevê:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]
O direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade é um preceito constitucional, que se sobrepõe aos outros.
Indubitavelmente, o maior de todos os direitos e que, por si só, permite a garantia dos outros é o direito à vida. Entende-se, portanto, que a pena de morte no Brasil, se implantada por lei, seria inconstitucional, salvo o caso previsto e já comentado (durante guerra declarada).
A grande questão é que o artigo 5º da Constituição Federal é uma cláusula pétrea, ou seja, não pode sofrer alteração, nem mesmo por emenda constitucional. Alguns juristas defendem, assim, que para instaurar a pena de morte no Brasil seria necessário convocar uma Assembleia Constituinte (colegiado responsável por elaborar e revisar a constituição). Outros estudiosos do assunto alegam, no entanto, que nem mesmo uma Assembleia Constituinte poderia trazer de volta as situações já extintas por outras Constituições Federais, como é o caso da pena extrema, pois seria um retrocesso na conquista de direitos sociais.
A pena capital para o Espiritismo
A pena de morte é uma violação das Leis Divinas. É faltar com a caridade e com o perdão. Recordemo-nos de Moisés no Monte Sinai, o qual, inspirado pelo alto, colocou na pedra os dez mandamentos (a primeira revelação divina), dos quais um diz: "Não matarás".
O direito à vida é a maior dádiva que o Espírito pode receber da Providência Divina, pois constitui oportunidade para seu progresso moral e intelectual, mas o ser humano, na sua imperfeição, deseja sobrepor-se ao Criador, instituindo leis que atentam contra a própria vida.