Conforme narrado pelo espírito Ermance Dufaux no livro Reforma Íntima sem Martírio, psicografado pelo médium Wanderley Soares de Oliveira (MG), houve na dimensão espiritual, nas dependências do Hospital Esperança, situado no ambiente astral de Minas Gerais, um conclave de líderes espíritas para importantes assertivas e orientações, tendo em vista o terceiro período do Espiritismo, a iniciar-se com o novo milênio.
Para podermos repassar com mais fidelidade o que foi dito nessa reunião, vamos transcrever alguns trechos do livro acima citado:
“Faltavam apenas dez minutos para as duas horas. A madrugada revestia-se de intenso trabalho. Era a última semana do segundo milênio da era cristã. As expectativas criavam um clima psicológico na Terra de rara amplitude – uma “virada” na qual as esperanças se renovavam coroadas de júbilo e fé.
Cumprindo mais uma de nossas programações no Hospital Esperança, reunimos influente grupo encarnado de pouco mais de mil formadores de opinião no movimento espírita. Trouxemo-los para uma breve e oportuna advertência. Radialistas, unificadores, médiuns, escritores, oradores, dirigentes, apresentadores, jornalistas, expositores, diretores, estudiosos e muitos presidentes de centro espírita estavam sendo devidamente preparados há quase três dias para que pudessem cooperar com o desligamento perispiritual e ampliassem sua lucidez quanto ao tentame.
O professor Cícero Pereira foi encarregado a fazer os comentários em nome de Bezerra de Menezes e Eurípedes Barsanulfo.
Observávamos a chegada de cada um dos membros, todos em estado de emancipação e acompanhados de pelo menos três cooperadores que se revezavam em várias tarefas, junto a cada um deles. Alguns ofereciam dificuldade até para se assentarem nos lugares a eles reservados no salão, contudo, no horário previsto, tudo era calmaria e prontidão para o serviço da noite.
Aos dois para as duas horas, entraram Eurípedes e dona Maria Modesto Cravo, ladeando o amado Bezerra e o professor.”
(...) Dona Maria Modesto fez um sinal ao professor, o qual assumiu a tribuna:
- Declinarei de quaisquer detalhes que nos desaproximem do tema. Desejo que todos enriqueçam as almas nesse conclave com a paz e a esperança.
Constatamos um ascendente número de adeptos que têm desistido dos ideais de melhoria, em razão do ônus voluntário que carreiam para si mesmos ao conceberem reforma íntima como um compromisso de angelitude imediata. O momento exige autocrítica e vigilância. Além do ônus do martírio a que se impõem, ilusões lamentáveis têm povoado a mente de muitos espíritas sobre o porvir que os espera para além dos muros da morte, em razão dessa angelitude de adorno.” (Reforma Íntima sem Martírio, pág. 175, 176 e 177)
Essas palavras refletem a exata realidade, porque encontramos a cada passo companheiros muito preocupados com essa “angelitude de adorno”, ao entenderem que dirigentes, expositores, médiuns ou quaisquer trabalhadores da seara espírita precisam mostrar ao mundo que são melhores que os outros, em razão da doutrina esclarecedora que professam, ou que necessitam vestir-se com as vestes da santidade para serem recebidos nos planos superiores após a morte. Então, ouvimos nos meios espíritas frases assim: “Um espírita não pode ter raiva”; “O espírita tem que ser paciente, manso, humilde e perdoar sempre”; “O espírita não pode ter medo de morrer”; “não pode isso, não pode aquilo... tem que ser assim ou assado...” e por aí afora.
Mas será que alguém, pelo fato de ser espírita, é capaz de passar pelas injustiças que a vida muitas vezes impõe, pelas agressões, humilhações e demais situações revoltantes sem sentir raiva, embora possa controlá-la e livrar-se dela em maior ou menor espaço de tempo? Será que a maioria de nós é formada por pessoas pacientes, mansas, humildes e que sempre perdoam, sem restrições? Será que nenhum de nós sente medo de morrer?
Por que então ostentarmos qualidades que ainda não alcançamos, passando uma falsa ideia sobre nós mesmos?
Lembremos que, na codificação da Doutrina Espírita, se diz que é possível conhecer-se o verdadeiro espírita pelo esforço que faz em melhorar-se. (Item 4 do capítulo XVII de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”). E esse esforço é que deve ser a nossa bandeira, assim como os valores que já conseguimos vivenciar em profundidade.
Na verdade, as posturas delineadas para o espírita são muito difíceis de ser desenvolvidas e mantidas. Somos seres egressos de longos percursos através dos milênios, nos quais fomos aprendendo e vivenciando alguns valores positivos, mas também negativos, muitos deles completamente enraizados em nosso psiquismo. Quem cultivou a violência, o orgulho, a prepotência, o desamor, a vaidade e demais atitudes e ações negativas em suas jornadas reencarnatórias (e certamente todos nós já desenvolvemos essas culturas) precisará de muita força de vontade, esforço e persistência para transmutá-los definitivamente em valores positivos, e isto certamente demandará muito tempo, provavelmente várias encarnações. Assim, com um mínimo de reflexão, podemos perceber o quanto é utópico esse enfoque da “angelitude imediata”. No mínimo, será apenas de fachada, sem a profundidade necessária para enfrentar incólume as intempéries da vida e as situações adversas ou estimuladoras dos valores negativos enterrados no inconsciente e não completamente transmutados em positivos.
Essas posturas que foram erigidas como padrões de comportamento, conduzem muitos companheiros à acomodação, bastando-lhes aparentar as virtudes solicitadas por esses padrões para se sentirem quites com a doutrina que professam. Com isso, furtam-se às devidas avaliações de si mesmos, do que lhes vai no íntimo, perdendo valiosas oportunidades de crescimento. Essa é uma característica herdada das religiões tradicionais que se ocupam com o exterior, sem maiores compromissos com o interior, onde reside a verdade de cada um.
Nessa passarela de perfis adotados dentro da seara, além de uma “angelitude de adorno”, que agrega admiradores incautos em torno de quem a ostenta, ocorre também, com grande freqüência, o oposto, a marginalização daqueles que não conseguem dominar seus impulsos, não se adequando ao modelo que foi criado para um “verdadeiro espírita”. Quem se encontra em situação dessa natureza precisa de fraternidade e compreensão (não conivência), além do auxílio dos companheiros para não arrefecer em seus ideais, ante as dificuldades que enfrenta. Com poucas exceções, isso não acontece, ao contrário, tal pessoa vê-se logo excluída, tachada de obsediada e relegada ao abandono.
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