24 de fev. de 2014

SUICÍDIO INVOLUNTÁRIO, O OUTRO LADO DA MOEDA





O escritor norte-americano Sidney Sheldon, relata em sua autobiografia (1), o episódio em que, ainda garoto, tomara a decisão de se suicidar, algo que seu pai, hábil vendedor à época, impedira, usando argumento bastante convincente.
Há dois modos de se interromper a vida por conta própria. O mais impactante é o ato tresloucado, desprovido de qualquer razão, em que o indivíduo usando de arma ou procedimento letal dá cabo à própria vida. O outro é praticado ao longo do tempo, através de atitudes que comprometem a saúde física e mental do sujeito. Exemplos: o uso de drogas, lícitas e ilícitas, de medicamentos sem a orientação médica e além do necessário, do alcoolismo, da promiscuidade sexual, da alimentação inadequada e exagerada, da poluição mental, por intermédio de ideias destrutivas, da submissão sem resistência ao pessimismo, da crença permanente de que se é um derrotado, porque não se consegue atingir metas para as quais tanto se trabalha e se luta.
Em o livro Nosso Lar (2), o personagem principal André Luiz, se surpreende quando é informado de que sua passagem pelo Umbral (3) se devia ao fato de ser um suicida, ainda que involuntário.
Camilo Castelo Branco, o célebre escritor português, autor de, entre outros, Amor de Perdição, um clássico da literatura, relata no admirável Memórias de um Suicida (4), as terríveis consequências que sofrera, em virtude de seu impensado ato, ao abdicar da existência humana.
O assunto está sempre em voga mas ganha destaque maior com o falecimento da cantora Amy Winehouse, que, após anos lutando contra o vício destruidor do álcool e das drogas, sucumbira aos efeitos devastadores de tais substâncias.
Considerando os ensinamentos da doutrina espírita, seria Amy uma suicida involuntária, ou seja, não tinha intenção, até onde se sabe, de se matar, mas acabou por fazê-lo, devido os hábitos agressivos que impôs ao seu corpo físico.
Por que tais fatos acontecem?
Bem, um dos motivos talvez seja por que nos falta a compreensão de que estamos em uma condição humana, mas, em verdade, somos espíritos. Portanto, até podemos acreditar que somos eternos, mas não temos a exata noção do que isso representa. Por conseguinte, não aceitamos que a experiência humana é mais uma etapa em nosso infinito aprendizado.
Para mensurarmos a dimensão e a importância da nossa experiência humana, ainda nos sujeitamos a conceitos de vitórias e derrotas, de êxito e de fracasso. Todavia, estas coisas, perdem todo o seu significado grandioso que a elas damos quando vistas do alto de nossas consciências.
Faça de seu corpo físico um santuário sagrado de devoção à vida. Esta deveria ser mais do que uma preocupação, uma meta a ser atingida. E os hospitais e as clínicas psiquiátricas, os presídios e os velórios seriam menos freqüentados.
Mas vivemos em um mundo cujos valores objetivos, como as conquistas materiais, portanto, efêmeras, prevalecem sobre os valores subjetivos.
Desde pequenos somos sugestionados e convidados a competir, a sobrepor o semelhante, a vê-lo como um inimigo a ser batido, e não como um irmão que encontramos em nosso caminho de aprendizado e com o qual podemos caminhar juntos, lado a lado.
O resultado, o sucesso e a vitória são tudo o que importa para nós. E quando ele não vem, porque nem sempre virá nos sentimos insatisfeitos, nos acreditamos incapazes, descremos de tudo, principalmente nas coisas que só o Bem proporciona. O Bem aos nossos olhos perde o brilho, torna-se inútil, sinônimo de derrota, de impossibilidade, de imperfeição e de insuficiência.
Daí é um passo para nos envolvermos com as energias inferiores, que, em nós, encontrarão refúgio para a sua escuridão. Então, estabelece-se uma simbiose, entre um e outro, criando uma atmosfera destrutiva, de alienação à realidade, que envolve e domina a nossa mente, posteriormente, nossos sentidos, e finalmente, o nosso corpo físico, tornando-o escravo das energias negativas, alimentadas pelos vícios de toda a sorte, principalmente àqueles que levam pouco a pouco à degradação moral e humana do indivíduo, ou seja, do espírito, que está na condição humana.
De aprendiz, liberto e senhor de si, em condições de realizar por si só, de aprender e de escolher, ele se torna escravo, submisso, refém da situação que, seja por descuido, ou opção, criou para si mesmo.
Sozinho, não conseguirá sair dessa "teia de aranha" na qual se meteu. Necessitará de ajuda. E, muitas vezes, tão desacreditado da vida que se encontra que ele não deseja essa ajuda. E só a terá de fato, a partir do instante, em que, cansado de sofrer, realmente quiser ser ajudado.
Observada de maneira superficial têm-se a impressão de que tal dramática situação só ocorre com artistas famosos, expostos às influências de toda sorte, em face o seu nível de sensibilidade mais aflorado. Mas não. O fenômeno se dá em muito maior número entre as pessoas consideradas comuns porque não são celebridades, não são artistas. Essas padecem com os sofrimentos, muitas vezes, solitariamente, abandonadas pelos próprios familiares, amigos e colegas de trabalho e de estudo.
Já é hora dos filósofos, psicólogos, escritores e artistas descerem do pedestal de sua auto-suficiência intelectual e buscarem compreender os ensinamentos de Jesus, fundamentados no amor e no perdão, forças motriz que propiciam a felicidade e a paz que todos buscamos.
A finalidade da existência humana não é competirmos entre nós, mas ajudarmo-nos uns aos outros em nossas jornadas de aprendizado.
A fé nos valores morais, a prática do Bem, o desapego consciente às coisas materiais, reconhecendo-se a sua necessidade, sim, mas jamais as tornando sustentáculos de nossa paz e alegria espiritual, são mais que mecanismos, são defesas ao alcance de todos, para que possamos passar ao largo das inclinações aos vícios, das quais todos nós estamos sujeitos, e que nos levam à destruição.
Elevemos o pensamento a Deus, nas horas de maior dificuldade. Lembremos que tudo passa, e todas as experiências por nós vivenciadas durante a trajetória humana são oportunidades para o nosso crescimento espiritual. Porque espíritos é o que de fato somos.


Notas:
1) O Outro Lado de Mim, Sidney Sheldon (Editora Record, 394 págs.)
2) Nosso Lar, André Luiz. Psicografia de Francisco Cândido Xavier (Editora FEB, 335 págs.)
3) Região no mundo espiritual de dor e sofrimento, para onde se refugiam espíritos suicidas, e aqueles dominados pelo ódio.
4) Romance mediúnico de Camilo Cândido Botelho (Camilo Castelo Branco) psicografado pela médium Yvonne A. Pereira (Editora FEB, 688 págs.).
*Artigo publicado no Site Autores.com.br: http://www.autores.com.br/34-ensaios/49171-suicidio-involuntario-o-outro-lado-da-moeda.html

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