9 de fev. de 2021

A questão da prisão perpétua

 



O Espiritismo tem, como sabemos, posição firme e clara sobre a questão da pena de morte. A visão da doutrina não se alinha a qualquer ato ou política pública que interrompa uma vida, até mesmo a de um criminoso contumaz. A adoção de tal solução, aliás, caracteriza sociedades tipicamente selvagens e intransigentes. Infelizmente, muitas nações não abdicaram ainda deste funesto procedimento.

Em contrapartida, a prisão perpétua representa um tratamento mais, digamos, humanizado para o delinquente. Há algumas semanas atrás, o jovem terrorista australiano Brenton Tarranti, responsável pelo assassinato de 51 pessoas nas mesquitas de Al Noor e Linwood na cidade de Christchurch, na Nova Zelândia, ouviu impávido essa condenação.

Vale frisar que o impiedoso terrorista utilizou armas semiautomáticas no ataque – o que contribuiu para um grande número de vítimas fatais. Mais ainda: demonstrando imenso sadismo, ele ainda transmitiu ao vivo as imagens nas redes sociais. Cabe também recordar que as pobres vítimas estavam fazendo as suas tradicionais orações de sexta-feira quando o covarde ataque ocorreu. Diante das evidências, o juiz do caso assim proferiu a sentença: “Seus crimes são tão perversos que mesmo que ele seja mantido na prisão até a morte, isso não esgotará a punição e a sentença que eles exigem”. 

Em nosso país, um conhecido criminoso carioca, Elias Maluco (1966-2020), responsável pela morte, entre outros, do jornalista Tim Lopes (1950-2002), não suportando os rigores da extensa condenação, deu cabo da própria vida pela via do autocídio. Posto isto, cumpre ressaltar que as sociedades humanas não têm um programa único para indivíduos desse jaez. Dependendo do país, as condições do condenado podem ser mais ou menos amenas, mas não é uma regra absoluta. No Brasil, por exemplo, as longas condenações acabam sendo bem aliviadas dada a benevolência do nosso código penal com os criminosos de qualquer espécie. Mas no geral prevalece a condenação ao isolamento até o fim dos dias do delinquente na encarnação em decurso. Por representarem grande perigo à sociedade, terminam a vida sob regime total de confinamento.

Nesse sentido, não encontrei um texto absolutamente cristalino com referência a esse tema no âmbito da Doutrina Espírita. Desse modo, o que podemos concluir a respeito? Creio que o tópico é pertinente considerando a quantidade de Espíritos presentemente encarnados que militam nas fileiras das trevas e, assim sendo, responsáveis por crimes inomináveis. Contudo, por mais que se discorde de tal arranjo, também não se pode, por outro lado, deixar de reconhecer que “Graças à Lei de Causa e Efeito, cada um é aquilo que de si mesmo faz. Conforme age, assim recebe a resposta da Vida”, conforme pontua o Espírito Vianna de Carvalho, na obra Atualidade do Pensamento Espírita (psicografia de Divaldo Pereira Franco).

Corroborando esse raciocínio, Allan Kardec observa, no livro O Céu e o Inferno, que “O Espírito sofre, quer no mundo corporal, quer no espiritual, a consequência das suas imperfeições. As misérias, as vicissitudes padecidas na vida corpórea são oriundas das nossas imperfeições, são expiações de faltas cometidas na presente ou em precedentes existências”. Assim sendo, ter a supressão da liberdade parece ser uma justa punição ao protagonista de crimes cruéis. Afinal, ao não saber conviver de maneira pacífica e respeitosa com os seus semelhantes, revela, pois, o seu instável caráter e grau de imperfeição.

Devemos ter sempre em mente que respeitar a vida, aliás, é dever de todos nós e em todas as circunstâncias. E quem demonstra inaptidão para tal comprometimento merece, sim, a justa punição. Ademais, a solidão de uma cela – por mais dura que possa ser tal experiência – certamente deverá conduzir o infeliz infrator das leis de Deus a refletir sobre a sua conduta desviada. As longas e penosas horas de isolamento provavelmente o levarão a repensar a sua conduta criminosa; a privação de movimentar-se livremente o incitará a valorizar a alegria de tão significativa concessão divina; a impossibilidade de se relacionar amiúde com os seus semelhantes, o farão considerar a riqueza do contato humano.

Assim sendo, tomando ciência de tais bênçãos, outrora menosprezadas, o Espírito delinquente inicia a dura jornada rumo à luz. Despertando para a necessidade de cultivar uma vida espiritualmente saudável, ele se equipa, por extensão, para os futuros e indispensáveis reajustes às leis divinas no plano material.

Anselmo Ferreira Vasconcelos

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